MINHA VIDA É UM PALCO

MINHA VIDA É UM PALCO
Somos como atores neste palco que é o mundo, as cenas são os dias e noites, e o roteiro quem escreve é a VIDA!A vida depois dos 60. É começar novo, novos horizontes, um mundo diferente e muito mais LEVE! A gente está sempre começando, sempre aprendendo...E aos 60 anos, a gente nasce de novo! A minha Infância da Maturidade! COMO SERÁ NOS 70?Na minha ADOLESCÊNCIA da Maturidade...CHEGUEI! Cheguei chegando imaginando a vida toda...70 ANOS! BÓRA LÁ QUE A VIDA TÁ PASSANDO!!!E até uma PANDEMIA!Nunca pensei ...De repente, ficar presa em casa, sozinha. Se sair, o CORONA VÍRUS pega. Horrível todo mundo sem se tocar.

terça-feira, 28 de julho de 2020

ESTOU CONHECENDO O BRASIL depois dos meus 70


Depois dos 70 eu escrevi que esperava muitas surpresas.
Não imaginava que seriam tantas e nunca esperadas. Tem uma rádio que diz "Em vinte minutos, tudo pode mudar", bem assim, muda mesmo. Mas nem sempre.Tem dias que não tem nada que preencha o vazio de um confinado em casa, ontem foi um movimento no meu whatss,  parecia que todos os amigos queriam contar alguma novidade, os grupos queriam voltar pro mexemexe, tinha série nova na Netflix, filme bom na Globoplay, vizinho trazendo bolinho de aveia, comprar frutas novas no mercadinho, pintar cabelo, aula de Espiritualidade, exercício pra coluna no CQV, o dia foi muito cheio. Amiga na Holanda, eram 10 da noite e lá ainda tinha sol, parecia cinema,foi lindo de morrer. Acho que ontem teve 30 horas. Mas...pra tudo tem um mas...Jurei não fazer mais isso, fi-lo porque qui-lo. Não conseguia dormir e liguei a TV em notícias. O mundo entrou direto na minha casa. Brasileiros nos quadradinhos. Depoimentos de gente que nesse dia perderam alguém para a face escura da morte. Eu até tinha esquecido que estamos em uma pandemia. Nós, brasileiros, sendo os primeiros numa estatística trágica. Até na minha cidade, até então sem nenhum caso fatal, agora chorando a perda de uma pessoa muito querida.
27 de julho de 2020.
Não consegui desligar a TV.
A minha solidão de confinada com um dia tão cheio de gente no meu celular agora era trágica, olhando pra telona e as gentes de todo meu Brasil lembrando de pai, mãe, filho, amigo, irmão,médico, enfermeiro, dentista, motorista, prima, que morreu vítima do corona vírus. Pequenos relatos, o contexto de cada pessoa, o desespero contido pela máscara com um microfone, as fotos de quem se foi, a dor concretizada e dividida com os telespectadores. Estatísticas da pandemia no Brasil. O olhar atrás da máscara queria um conforto, uma explicação, queria gritar sua dor, pedia pra mim um novo olhar, era uma pessoa, não era um número. E ainda tinha força pra me pedir pra me cuidar, "não quero que sintas a dor que estou sentindo, meu marido morreu porque não teve leito na UTI".  Mas aqui na cidade que eu moro tem tudo, pensei. Bons hospitais, plano de saúde, se eu for infectada serei bem assistida. Mas as imagens de dor e revolta continuavam...Lugares sem acesso, sem médicos, sem cama, pessoas até então invisíveis. Milhares. Milhões.Eu queria não ver mais. Desligar a TV.
Egoísta. Foi bem assim que me senti. Egoísta. Reclamando de ter que ficar sozinha em casa. Que sentimento é esse? Será que é essa presença diária da morte?O que é a vida frente a falta de um respirador? O que é a precariedade de tudo, agora escancarada no meu Brasil do futuro que chegou tão abandonado?
Li nem sei quantos livros, revistas, vi documentários, acompanhei revoluções, saía pra rua pela liberdade, era o MEU País!Eu sabia tudo sobre o MEU país. NADA, sabia apenas o que todo mundo via. Do país abençoado por Deus e bonito por natureza, foi instituída a miséria de um povo escravizado pelos sucessivos governos de desatinos humanos.
Nesta pandemia, o Brasil foi obrigado a mostrar a cara. Não tem mais como esconder.
Estampadas pelas lentes  instantâneas de milhares de câmeras, não tem mais como esconder a realidade que nunca quisemos ver. Enquanto alguns continuam a acumular riquezas que não lhes pertencem, aumentam os sem salário, sem trabalho, sem dignidade.
Uma luz hoje no túnel é solidariedade, essa coisa que o povo faz para o povo, eque vemos chegarem sacolas de alimentos em lugares nunca mostrados, pessoas que agradecem por um prato de comida, filas que aumentam diariamente porque a pandemia é uma guerra sem tempo definido pra acabar.
Aqui dentro está tudo bem. Ali fora, também. Mas, escondidos pela discriminação da miséria, existe um povo que a bandeira empresta a toda tirania.
 As cenas de uma febre espanhola, de uma peste negra se repetiriam nas praças, nos parques, nos shoppings, nos supermercados...pessoas matando para comer, mães furando os dedos para alimentar os filhos.Isso eu li em livros sobre guerras e tragédias. Ficção ou realidade. 

Não sei se tenho coragem de publicar este texto. Mas é uma história de verdade. Sou otimista e realista, talvez com toda essa tragédia a política seja revisada para o que realmente se propõe: o bem do povo. De TODO o povo.
BELLABEREG, Curitiba, dia 28 de julho de 2020.

Abc do Abc - abrindo a cabeça

sábado, 25 de julho de 2020

A REVOLUÇÃO DOS NETOS - Vovó na Pandemia

Netos da VÓ GLADIS

Tania Carvalho, no Sábado na Gaúcha, falou agora sobre A Revolução dos Bichos, de George Orwell. Nada a ver com o título A REVOLUÇÃO DOS NETOS. Ou com o Empoderamento dos Idosos. Ou tem muito a ver. Pois amanhã é o dia que os avós inventaram para ganhar presentes. E abracinhos e beijinhos dos netos. 
Porém...parece que com a pandemia, a gente vai ganhar é beijinhos pela tela.Uma serenata na frente de casa. Cartazes lá embaixo, no prédio. E a gente na janela com lágrimas de agradecimentos pela homenagem. Ou Whatts, Zoom, etc...balão, bolo, cartazes, e isso faz tão bem, só temos que agradecer, é o que temos pra hoje, Graças a Deus, esses momentos vão encantar nossa memória. 
Nós, os AVÓS.Eles, os NETOS: Uma experiência surreal, como nascer de novo com cada milagre no mundo, cada bebezinho, cada criança, um adolescente, os adultos sempre netinhos, a Esperança renovada. Mais tranquilas e felizes estão as famílias, que desde o início da pandemia moram na mesma casa. Se cuidar dos netinhos era uma obrigação, hoje é uma vantagem. Minha realidade é outra. Moro sozinha. Assim como a realidade de muitas amigas desta fase de avó idosa, aposentada.
Este confinamento,este distanciamento, os almoços de domingo que agora não tem, nos deram um mundo diferente. Egoisticamente, a gente reclama. 

A reflexão de hoje vai no rumo inverso, imaginar como estão os netinhos nesta quarentena. Principalmente os pequeninos. 
Preciso contextualizar.Gaúcha, gosto de contar histórias:

Miami:aprendendo com LUISA 
Minha primeira neta nasceu em New Haven, Connecticut, e mora no outro lado do mundo, Austrália: Luisa, THE FIRST. Ser a primeira neta é aguentar overdose de avó.   Ainda bem que já existia o Skype,  aqui meio dia, lá meia noite, fim de semana eu olhava os filminhos do Sapo não lava o pé,  cada semana uma novidade, uma vez por ano a gente se encontrava presencialmente e era uma festa. Neste mês, Luisa fez 18 anos. Estamos falando sobre filmes e livros.
Luisa, Felipe e vovó em Byron Bay

 Meu segundo neto também muito longe, Felipe,o australiano, longe e muito perto por todo o amor de vó e neto. Muito esporte, futebol, gremista como o pai e o avô, vovó aplaude tudo!

Vinicius e vovó em show de rock
Meio mês depois veio o terceiro, Vinicius, o curitibano, não tão longe, Curitiba, mas pra quem é de Uruguaiana como eu, tudo é longe. No meu exílio em Curitiba esse neto me fez companhia nos momentos mais difíceis de adaptação.
Felipe e Vinicius meus adolescentes de hoje.


Minha mala no Cassino: Vinicius e Felipe
 E eu viajava pelo Planeta: avião, ônibus, carro, como dava nas férias anuais pra lá ou em feriadão aqui, só pra ver os netos.E a alegria quando todos iam visitar a vovó Gladis no meu paraíso de Mar, no Cassino, vovó trabalhando todo dia mas sempre com muita comida, bebida, doces, energia de Bellagamba,  aquela bagunça em deixar os netos fazerem tudo e os pais culpando a vó por mal ensinar os netos e dar picolé toda hora, e eu nem tchum pra eles, afinal, ser vó é não ter vergonha de ser feliz.


Malu e Martin, BIGOS da vó.
  Então, chegaram os BIGOS.(BIGOS:de minha autoria, proibida a cópia).
 Foi um Renascimento pra toda minha Pequena Amada Grande Família. Malu e Martin, Curitibanos. A convivência desde antes até o nascimento, o compromisso de me manter a postos, cuidado pra amar muito sem atrapalhar, estamos aqui, mais de três anos com essas crianças iluminadas.  Morando a uma quadra da casa deles, numa capital como Curitiba, eu mais de 70 anos, com muito tempo disponível, e também com muitas articulações endurecidas. Mas sempre disposta a enfrentar até uma pandemia pra dividir esta fatia do tempo com todos, conectada com os de longe e com os de perto, assumindo ser avó de longe. E de perto. 
BIGOS e VÓ

Ironia, parece: tão perto, e tão longe. Vovó não pode fazer isso. Vovó tem que ficar em casa. Stay safe, stay inspired.
Hoje, 25 de julho de 2020. mais de cem dias em estado de guerra contra o Covid19, estou utilizando todas as armas para enfrentar esse vírus, enquanto não chega a vacina. Consulto todas as fontes seguras que explicam como se comportar frente ao avanço dessa pandemia e como evitar contágio e propagação. 
Tá, depois de toda essa história, por que REVOLUÇÃO DOS NETOS?
Porque acho que,  se eu fosse netinha hoje, eu faria como fizeram os BIGOS, na minha visita das quinta-feiras, quando vim pra casa: 
- Tchau Martin, tchau Malu, vovó vai pra casa dela. (Não sei por que a gente fala em terceira pessoa, preciso mudar isso)
Martin me puxou pela mão e falou:
- Não vai pra casa. Vai ficar com Martin. 
- Eu preciso fazer comida, arrumar minha casa-falei.
-Vó - Malu foi até a porta, abriu os braços - não vai, vó.A Vó não pode. Você fica pra brincar.
Martin também correu pra aumentar a barreira. 
Foi a REVOLUÇÃO DOS NETOS. 
Está mais fácil chegar lá, na casa deles, tantos cuidados aqui fora. Difícil é voltar.Não sei como consegui abrir a porta. Não vou contar que saí chorando, não sou frouxa(?).Acho que estou ficando velha, eu sempre me despedi de netos e ficava firme. Mas os pequeninos...Como entender a despedida física nessa idade? Eles, meus BIGOS, têm argumentos e estratégias nunca imaginadas...Fico pasma! Tipo: Tem corona vírus na sua casa!
Por isso, está cada vez mais difícil dizer tchau. 
Não é apenas apertar na bolinha vermelha do celular. 

Netos revolucionários. 
Ainda bem.
Juro que não tenho culpa. 




Amanhã, dia 26, também é aniversário do meu pai. Adão Antunes Bellagamba.Vô Adão. Feriado em Uruguaiana. 


Minha mãe, a Vó Zoé, com os netos mais velhos
(tudo não estragado)


E se a gente pudesse ter uma casa como a do meu pai e da minha mãe,na XV,  
onde a gente deixava os filhos, e a vó simplesmente deixava todos fazendo não-sei-o-quê, 
e a gente confiava tanto na vó, tudo que ela fazia e dizia estava bem, não existia aquilo de que
 "a vó estraga os netos".
E a gente tem que procurar uma psicóloga pra aprender a ser vó 2020. 

quinta-feira, 23 de julho de 2020

VELHO DISCRIMINADO?IDOSO EMPODERADO!



EMPODERAR é o verbo da moda.

Empoderamento da mulher, empoderamento do gay, empoderamento do negro, empoderamento do artista, empoderamento da gorda (não sei por que não falam do gordo),  e por aí vai. 
Pois eu estou na batalha do EMPODERAMENTO DO IDOSO. 
Com o isolamento total do grupo de risco nesta pandemia, necessário frente a um vírus inexplicável e terrível, os primeiros a serem confinados fomos NÓS, OS IDOSOS! Não houve uma triagem para ver se o idoso tinha OUTRAS doenças a não ser a idade, bastava ter mais de 60, pronto! Tranca o velho! Tinha até velho importante na TV ameaçando os outros velhos sem cargo público: "FIQUEM EM CASA, PÔ! Se continuarem a sair, vocês vão ver o que é bom!"
Moral da história: Os idosos foram encarcerados! 
- Vó, é pra te proteger do vírus!
- Mãe, se fores contaminada, vais pro hospital e nunca mais vou te ver...
- Vô, deixa de ser teimoso, não adianta sair escondido, o covid está te esperando lá fora.
- É pro teu bem, nós te amamos! 
- Reclamando de quê? Tem casa, comida, sofá, TV, celular pra ver os netinhos, ganha tudo na mão...

... E o tempo passando e a gente se acostumando. Afinal,meu dever cívico com mais de 70 é esperar a vacina, não vou preocupar a família.  Meu vizinho nem saiu de casa, pegou o corona e morreu. Foi muito triste. Tinha 80 anos e era cardíaco. A sobrinha da amiga da minha amiga não tinha doença, pegou o covid 19 no trabalho e se foi, com 23 anos. Tragédias diárias da pandemia. O vírus não faz discriminação.
Todo cuidado é pouco. Mas... Depois de mais de 100 dias, a cidade num abre e fecha, os velhos continuam velhos mais velhos e discriminados. Ou será que já foram esquecidos?  
Álcool gel, máscara, falar atrás da janela, estou condenada a não participar mais da sociedade. 
Até agora não vi nenhuma pesquisa sobre quantos idosos morreram do abandono físico, afetivo, mental. 
Doenças à parte, o velho foi discriminado. Olhado como apenas velho na certidão de nascimento, nunca mais na história deste país,  o velho foi respeitado pela salvação da humanidade. Foi transformado num problema social. O responsável pela crise na previdência. Um pária. Um teimoso. Uma ameaça. 
 Agora, apenas é responsável por não ocupar um leito. Imagine, uma colega da minha idade diz que se estiver num leito de hospital e chegar alguém com menos de 60, ela levanta da cama e dá lugar pra aquele. Ou seja, se eu não presto mais pra nada, tanto faz.  Assim como no ônibus, mas invertido: os velhos dão seus lugares aos jovens. Mas não é esse mesmo jovem que pede ao vovô pra ficar em casa? Pois não quero que você morra, eu te amo! Pai, não entra em ônibus? Mas se o velho tem carro, sair ele pode. Ir ao mercado, ele pode, afinal, não vai ter contato nem com outro velho. Mas tem que ser das 7 às 9 da manhã. Com esse frio? Vou é pegar uma pneumonia. Às vezes, penso até que são os velhos que atrapalham o trânsito e as negociações do G5.
Então... Não me culpem se eu sair escondida, disfarçada de antes da melhor idade. Cabelo branco pra dentro do chapéu, óculos escuros e máscara 3D, roupa discreta e sacola retornável. Minha fantasia de quarentena. 
Repetindo: Não toque na máscara, álcool na mão, não fale com estranhos e em hipótese alguma fale com conhecidos. Procure um supermercado ventilado, onde seus filhos não vão!
LEMBRE-SE: Quando tudo abrir de novo, os últimos a serem liberados pra sair de casa serão os que primeiro foram presos: SERÃO OS VELHOS! Que estarão mais velhos...
Todas essas reflexões eu tenho porque tenho tempo, "mãe, agora que tens tempo, aproveita pra fazer yoga e meditação", por favor, filho, fechada em casa todo dia o que mais eu faço é meditação. 
Por que não aconselham a fazer LIVES? A escrever sobre meus problemas nesta fase de confinada?  
Só os políticos com mais de 60 podem ser políticos? Quantos presidentes têm menos de 60?Poucos. Os mais famosos já estão na faixa de idoso. Estão fechados em casa? NÃO, estão influenciando o mundo, transmitindo o que sabem, respeitados pela experiente sabedoria. (tudo bem, tem alguns que são totalmente teimosos e insanos...)
BY THE WAY
Esses argumentos estou registrando para minha campanha. Vou entrar no Insta, no Face, vou Tweetar, quem sabe me candidato a vereadora e apareço na TV. Influenciadora de idade do You Tube. Quero EMPODERAR OS IDOSOS! Principalmente AS IDOSAS!


                    CHEGA DE DISCRIMINAÇÃO!
          
                       IDOSA EMPODERADA 
                              NÃO É 
                 VELHA DISCRIMINADA! 

COMPARTILHE SE QUER SER EMPODERADA(OU EMPODERADO, SEM DISCRIMINAÇÃO)

  

quarta-feira, 22 de julho de 2020

"O HOMEM, ESSE ETERNO MASCARADO"

Awebic autossabotagem


Mario Quintana. Sempre atual. O homem, esse eterno mascarado.


Ele dizia que quando o homem descobriu a própria nudez, inventou a máscara. Para esconder-se da vergonha de ser. Amarrou um pedaço de couro para cobrir suas vergonhas, aqueles primatas. 
Depositphotos
Até hoje, com botas, casacos, bolsas, um minúsculo biquini ou um traje chiquérrimo de rainha, roupas, acessórios, até desenhos,  cobrem a pele humana. Por fora. Indicam  nacionalidade, crença, desejos, mostram poder ou miséria. 
O homem, esse ser fantasiado. 
Como se não bastasse a aparência externa de um visual para externar as diferenças, o homem quis descobrir o outro pela comunicação. Sinal de fumaça, impulsos elétricos, ondas sonoras, sons e imagens.  
Surgiu o telefone, o homem ficou deslumbrado ao falar sem ter que se mostrar ao interlocutor.
O imenso mundo se transformou numa aldeia global. A lua dos namorados pisoteada pelo homem virou uma bola azul. Veio o computador, e com o Skype e o Orkut, os amigos foram chegando pela tela instantânea de qualquer lugar do Planeta Terra. A carta contando novidades de longe, a foto da família, essa carta tão individual, com essa foto tão íntima,  deixaram a distância do tempo para o quase agora: O Face revelou não apenas a imagem, mas a imagem que é preciso pra se definir na rede social, verdade e mentira, realidade e ilusão, o computador entrou no celular e aqui estamos na mão e no olhar, revelando até as intimidades que poderão se tornar públicas num simples click. Paisagens, festas, viagens, a necessidade de postar, postar, postar. E as máscaras cada vez mais apelativas na incrível necessidade de se mostrar, não basta ser, tem que parecer. 
Foi aí... Deu um blecaute. 
mascarada Pinterest timbublr

Apocalipse, peste, praga, guerra, solidão. É esta pandemia, um vírus que os homens carregam e disseminam, viaja pelo Planeta e entra sem avisar nos corpos pelo contato carnal, pelo beijo e pelo afago. Como viver sem? 

Condenado ao isolamento físico, o homem sozinho  não precisa de máscaras. Postar o quê? Melhor uma live, chamar pessoas também  confinadas para o quadradinho da tela e clicar. 
A emoção do postar, postar, postar foi substituída pelo vídeo imediato.  Sua casa, seu quarto, sua mesa com comida, suas roupas da cintura pra cima, às vezes pego em flagrante íntimo consigo mesmo escabelado,com a cara natural num momento em que não queria aparecer. Sem máscara. Sem obrigação de aparentar para a sociedade. 
 Afinal, tem uma pandemia. Não tem reunião com amigos. Saco cheio. Mente vazia. Vontade zero. Não pode fugir pra casa da mamãe. Mamãe também está isolada. 
                             .    .   .
Sorte do homem que tem comunicação virtual,ele sempre quis descobrir como se comunicar  de longe. Conseguiu. Agora pode. Máscaras caem a todo momento.Pra que comprar roupas? Por que ostentar as jóias?E a bolsa de 5 mil, qual a necessidade?
  Sem abraço, sem beijo, sem aperto de mão. 
Basta  Google Meet, Zoom, Messenger, Skype, Whatts - whatts, o supremo companheiro, o maior acompanhante neste verdadeiro vazio existencial. 

POIS  o homem de agora não quer mais isolamento. Não quer mais ficar na frente do computador. E dizer que só fazia isso...
Agora quer gente tocável, palpável, agarrável.

E para ir pra vida lá fora, vai usar máscara pra se defender da morte.  De novo. 

O homem, esse eterno mascarado. 

sexta-feira, 17 de julho de 2020

SAINDO DA NOVENTENA




Chega!
 Hoje completo 4 meses, 3 dias, 7 horas, 56 minutos, 27 segundos fechada no meu apê. Morrendo de medo do corona me pegar e eu ir pra um hospital que não tem leito pra velha doente com covid ou sem covid, vai ser tudo a mesma coisa, e se eu morrer nunca mais vou ver meus entes queridos, minhas amigas, minhas colegas, o cara da entrega, e o que é um terror: meu celular, nunca mais! Vão me fechar num caixão, vou ser cremada - como eu queria - mas  será que vão me queimar direitinho? Não vai ninguém me acompanhar, e as minhas cinzas também serão incineradas como material radioativo? Eu queria minhas cinzas jogadas nos oceanos...Será que vão misturar com cinzas de gremista? 
Por tudo isso, fiquei todo esse tempo olhando o mundo pela minha janela. 4 meses, etc.etc.etc.O Inter 2 - aquele ônibus de fole, comprido, já passou lotado, já passou vazio, não passou, agora está mais ou menos cheio, a igreja da frente já fechou, já abriu um pouco sem música, fechou de novo e as poucas pessoas entravam pela garagem, furtivas...Diz-que agora vão entrar com metro e meio de distância umas das outras...Até os velhos e as velhas apareceram caminhando, devagar, abafados pelas máscaras, afastando todas as pessoas que não são velhas. Os cachorros continuam levando as pessoas a passear, fazem xixi e cocô em toda árvore e portão, fazem cocô e os donos com as sacolas plásticas juntando e deixando nos lixos dos outros, ninguém para reclamar.
Gente bem educada, os passantes da minha janela.

Pois HOJE é o dia da minha libertação. 

Vou vestir as roupas e sapato novos, que estão guardados para momentos especiais, fiz máscara vermelha com viés branco, meu cabelo que cresceu e está com raízes brancas, me disseram que é moda; "não passar batom", me disse uma amiga que tem prática em sair pra rua, pois mancha a máscara. Dá para pôr brinco, de preferência de brilhante. A bolsa grande não dá pra levar pois atrai o vírus, que estará me esperando lá fora. 
Nem vi o noticiário das estatísticas de hoje,quantos pegaram o vírus,  essa minha saída deve ser uma decisão minha respeitando o coletivo. Enfim, livre. 
Vector.me
Na rua, com o sol na cara, caminho contra o vento, com máscara e documento! 
Faço toda a volta na quadra, aceno para os carros, dou bom dia pra senhorinha sentada atrás das grades, afinal, consegui ! 
Bora lá, MUNDO!!!
A volta pra casa, ofegante, satisfeita, emocionada! 

(Nem deu trabalho tirar tudo para lavar, um banho relaxante, estou doida pra postar essa minha aventura. Agora tenho novidades...)

sábado, 13 de junho de 2020

SANTO ANTÔNIO, ME DÁ UM MARIDO!!!


Plaquinha Casa Festa


Véspera de Santo Antonio. Já faz anos que não fazemos mais as provas. A gente chamava de PROVA, era um preparo da casa, com a melhor sala com tudo que fosse preciso para realizarmos AS provas: uma bacia grande, copo, água, papel...
Lá fora, um quintal grande ou pátio aberto, ou campo, a fogueira preparada, tinha fogueira todo mês de junho, Santo Antônio, São João dia 24, São Pedro, dia 29, Padroeiro do Rio Grande do Sul, mas no 12 de junho (década de 50), não era dia dos namorados, era o dia de PEDIR MARIDO pro Santo.
Moças, meninas moças, solteironas, todas se reuniam na casa da mãe mais dedicada a desencalhar as gurias. Avós, mães, madrinhas, tias, todas ajudavam a montar a cerimônia. Os pais ficavam na torcida, se a filha fosse uma desfrutável ou muito feia iriam ter problemas.
Quem se lembrar, me ajude, vou falar só das provas mais decisivas e impactantes. E tudo DE VERDADE, a coisa era séria. Quem não se casasse, teria que cuidar dos irmãos, dos sobrinhos, dos velhos da família, e ainda fazer os trabalhos de casa. Casar era ter a própria casa, mandar na vida, fazer sexo. Era uma festa! Muito riso, muita animação, segredos revelados, quem já beijou, tudo esquentando...
Então, as prometidas sentadas ao redor da mesa, as famílias preparando a festa, crianças enxotadas pra fora da casa,Santo Antônio, coitado, com toda a responsabilidade.
Mais ou menos assim:
- copo com metade de água, uma aliança de qualquer pessoa pendurada por um fio do próprio cabelo, pendurava dentro do copo, quase tocando na água; não podia mexer a mão, a coisa era meio sobrenatural, a aliança começava a balançar sozinha, e... quantas vezes a aliança batia no copo, eram os anos que faltavam para o casamento. Algumas devotas do Santo queriam morrer quando a aliança batia sem parar; mas como a moça ficava feliz quando davam duas ou três badaladas...O pior: quando a aliança ficava pendurada, sem se mexer...a criatura ficaria encalhada pro resto da vida!!!E ninguém roubava no jogo. Mas muito engraçado. 
- uma bacia grande com água, um barquinho de papel pronto para navegar na bacia, e ao redor,  por dentro, colados, papéis com o nome das casadoiras. Fazia um redemoinho na água, e, dentro do barquinho de papel o nome de um dos grandes partidos da cidade, conhecido pelo grupo, desde um garanhão lindão até o mais transparentes ou infeliz dos mortais. O barquinho iria parar num dos nomes. O pior ou melhor é que acontecia o casamento...
- num pedacinho de papel, escrevia o nome do desejado marido, enrolava bem e enfiava dentro de uma laranja:essa laranja ia pra cima da casa. Ficava toda noite lá. Na manhã de Santo Antônio, ia pegar a laranja, devidamente molhada pelo sereno ou geada da noite: se estivesse intacta, nada feito; se amanhecesse aberta, casamento na certa.
- copo com o dedo de todas, nomes dos rapazes colocados ao redor da mesa, alguns pontos de interrogação, falava-se o nome da moça casadoira, o copo escolhia.Interrogação era quando o pretendente ainda não tinha aparecido...Parecia o jogo do copo de hoje, quem sabe, esse jogo surgiu por causa desse desafio junino. 
- Segurar a vela pingando na água da bacia: formava uma letra, a letra DO AMADO! E aparecia! Não tinha como roubar...

E lá fora ficavam os guris,os moços, pretendentes e candidatos,nervosos, fumando e bebendo, esquentando a fogueira, esperando que o Santo resolvesse a vida deles...

E o Santo, coitado, todas as mães colocavam Santo Antônio em lugares estranhos, e enquanto a filha não casasse, o Santo ficaria preso, sem vela e sem oração.

Mas como era bom quando dentro da casa a função terminava,era uma gritaria, mocinhas enlouquecidas e alvoroçadas, moços ansiosos já aquecidos,  todo mundo ao redor da fogueira,  tinha música, dança, muito amendoim e quentão com e sem álcool, muito chimarrão passando de mão em mão, e as mãos passando.
...Pois o namoro vai ser sempre uma conquista e uma surpresa. 

Por mais que mudem as atitudes, continuam as escolhas.
 Ontem vi a live do Fabio Junior, hoje tenho a live do Luã Santana. Puro amor.  Pois namorar é bom.E não adianta querer só virtual.  Vou parar por aqui... Santo Antônio é terrível!

segunda-feira, 1 de junho de 2020

O COV ME PEGOU!


Foi uma noite de terror.
Eu não consegui engolir. Uma vez. Duas vezes. Tentei de novo. Nada. Não consigo engolir.Foi bem assim.
 Parei pra pensar. 
O que está havendo? Minha garganta fechou? Tentei de novo. Nada. Pequei a garrafinha de água, sentei na cama, enchi a boca de água. De novo. Nada. Eu não conseguia engolir.
 Pensei, vou levantar. Mas se eu cair no chão do meu quarto? Eu, sozinha. Não adianta chamar, não adianta gritar, o celular ficou carregando na sala. E já é tarde, nem vizinho vai me atender. As pessoas podem achar que eu estava louca. 
Mas...
Experimente ficar sozinho, de madrugada, sem conseguir engolir. Um dos sintomas da pandemia. Garganta que fecha.Até minhas pernas estavam frouxas.  
E se eu ligar do fixo que tem ao lado da cama? Chamar um filho? Um amigo? O que vai acontecer comigo? Vão me levar para o hospital, vou ter que deixar este meu isolamento com TV, celular, caminha bem quentinha,cozinha cheia de louça do domingo,foi um domingo tranquilo com sol e bergamota e muitas conversas pelo whats, pela janela, pela área aberta do prédio, comida, bebida, lives, muito whats até em grupo. 
Consegui engolir um pouco da água. Ainda consigo respirar. Mas não consigo engolir. E as dores já estão no pescoço. Nunca mais vou ver as pessoas que amo. 
É o ar. A falta de ar. 
O ar que a gente tem de graça, isso não vou ter mais. 
Acho que peguei o cov. Ou o cov me pegou. 
Acho que quando fui ao mercado comprar ovos.E resolvi comprar bergamota, também. Falei com uma pessoa que estava sem máscara, acho que foi aí, ela estava de longe, mas nunca se sabe. 
Ah, já sei! Foi quando peguei o celular da vizinha para olhar a foto do neto, mas ela também passou álcool gel.
Também esqueci de tirar o tênis ao entrar em casa. Devia estar cheio de cov.  Mas eu estava de máscara, passei álcool gel em tudo. 
Tudo passa como num documentário na minha cabeça, muitos flashes.
 E não consigo engolir direito. 
 Ainda bem que não tomei o zolpiden pra dormir, como vou dormir sem respirar? Dormir mesmo com zumbido dá certo, então! se esse remédio é para eu dormir mesmo com o zumbido gritando na minha cabeça, talvez seja a solução.  E se estiver dormindo, não vou me dar conta que não respiro. Tá.
Tomei o  remédio. Com água. Consegui engolir um pouquinho mais de água. O ar entrava e saía lentamente.Não lembro de mais nada.  
Abri os olhos. A TV continuava ligada, não foi pesadelo!  Devo ter apagado. Sempre fico apagada por 5 horas. Mexi pernas, braços, espiei aclaridade, quer dizer que eu estava vica e consciente. Senti o cheiro do frio. Engoli eu mesma. Eu continuava sem engolir direito. Levantei, fui ao espelho, não consegui ver minha garganta.  Sem dor no pescoço e nas pernas,passei e cheirei o café, estou com gosto e olfato. O café desceu devagar esquentando tudo,  e foi o melhor gole cheio que tomei na minha vida! Eu estava viva e, ao que parece, estou com laringite ou faringite ou qualquer outra ite. Vou esperar. Já estou acordada, escrevendo, rotina da manhã, já engolindo não muito bem, mas funcionando. 
Vou continuar observando. Ontem no mercado toquei em muitas bergamotas.E comi algumas. Não passei álcool gel nas bergamotas. Pois é.


GauchaZH

terça-feira, 26 de maio de 2020

HISTORINHAS INFANTIS 2020


         Era uma vez um reino encantado habitado pelas amebas. 
         Estava tudo na santa paz , cada um no seu quadrado e as amebas todas vivendo como amebas: nascendo, crescendo, trabalhando, tendo filho, comendo, bebendo  e morrendo.
          Certo dia, acordaram com um rugido muito forte, ninguém sabia o que estava acontecendo. E se soubessem, amebas são amebas. Tanto faz, pode ser uma congestão, pode ser uma hemorragia, pode ser um um acidente vascular, tanto faz. Ameba continua ameba, pode até ser uma expulsão de gases. 
           
          Mas alguma coisa de podre no reino estava acontecendo. 
Dreamstime
          As bactérias estavam  se proliferando, se manifestando. A mãe das bactérias  resolveu botar a boca em todo mundo. Estava indignada, as amebas não estavam obedecendo, encheu todo mundo de palavrões, impropérios, a bactéria estava muito, mas muito fora de controle e dos padrões do reino. Mesmo num reino de amebas. 
         Ainda bem que surgiu um vírus pra enfrentar a bactéria. Um vírus que vinha para fazer milagres, aquilo de mudo ver e cego andar. Os vírus estavam, também, se manifestando.
        Parecia que a guerra chegara ao reino encantado. Vírus e Bactérias enfim detonariam até as células mais divinas do Universo. 
       Parece que a guerra nunca mais vai acabar. 
       Até hoje estão discutindo quando começam os jogos e o carnaval. Quem nasceu primeiro, a bactéria ou o vírus? Ninguém se entende.

       E as amebas continuam como sempre. Com a eterna missão de passar.
       Nem se deram ao trabalho de se reunir. Afinal, quem se preocupa com amebas?
       Discutir o sexo dos anjos? Como boas amebas, no Universo das amebas, muitas ficaram nas praças ou trabalhando, outras continuaram em casa, muitas morreram, muitas nasceram, e assim continuaram felizes para sempre. 

quinta-feira, 14 de maio de 2020

E SE...FOR PRO HOSPITAL?

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Foi uma noite de terror. A amiga de uma amiga contou.

Fiquei muito impressionada, Dona Maria teve toda razão em se preocupar. E se....Pode acontecer com qualquer uma de nós, fechada em casa, pensando, afinal, pensar é muito importante.
E se...
 Mas o pior de tudo é que pode bem acontecer e ter um final diferente. Depois desta história, já avisei aos filhos que não deixem me levar pro hospital. Quero morrer em casa. Aliás, não quero morrer, mas quero ficar em casa.Sério, não estou brincando. Fique em casa, então, fico em casa! 

Estamos numa guerra, e minha turma é igual à da resistência francesa na segunda guerra. Agimos nos porões da consciência. Estamos sempre imaginando o que pode acontecer.E se... o que fazer se infectada pelo inimigo?
Esta é a história:

Dona Maria. Idosa, grupo de risco, 70 anos, cardíaca, hipertensa, mora sozinha.Aqui, em Curitiba. Tem EcoSalva, se tiver alguma coisa, chama a ambulância e tem atendimento, já passou por isso e foi tudo bem, os vizinhos ficaram curiosos, será que está com coronavírus? Não, ainda bem, apenas a pressão andou subindo. 
Agora, estava bem. A filha mora longe, com o marido e três filhos pequenos,longe daqui a umas duas horas de viagem. A filha e o marido se revezam nas noites para cuidarem dos filhos, trabalham cada um uma noite, então, a coisa dá bem certinho. 
Estava tudo controlado como quer a família, os amigos e os olheiros. A velha é bem tranquila, vive se queixando que está mofada, nem na igreja pode ir. Pior ainda, é o bingo: não tem bingo.Então...até aí, tudo igual pra tudo que é velho, fique em casa é um mantra.
Em casa, sim. Sozinha, nunca. Todo mundo diz isso, mas Dona Maria está sempre sozinha.  Não tem o que fazer, fica no whats,vendo bom dia, boa noite, mensagens de que tudo passa. Tem dias que liga para as amigas ou está sem saco e faz palavras cruzadas. Na TV, toda hora é pra dizer quantos morreram lá fora, Covid 19, quantas camas ainda tem ou não tem mais cama, quem quiser morrer não vai poder, nem caixão tem mais. Melhor ficar no Zap Zap.
 Dona Maria tem hora certa pra tudo, principalmente para tomar remédio. E também pra falar com a filha e os netos. Com o isolamento e a prisão em casa, Dona Maria é bem organizada, não incomoda muito a família. 

Só que...ontem foi a noite do terror. 
Dona Maria vai falar com a filha, vídeo no whats, ainda bem que tem isso, as distâncias não existem mais. Poder enxergar os netos todas as noites, brincar com os anjinhos, um com 4, outro com 2, a menor com 6 meses, a Ana tirou as trompas, que facilidade pra engravidar.

 - Minha filha, como passaram o dia? O Eduardo melhorou da alergia? - Aninha sempre cansada, pobrezinha, trabalha muito, as crianças todas em casa, a creche acho que nunca mais vai abrir, a vó longe, mas eles não querem que ela more lá, a cidade é muito pequena,  mas os salários são bons. A imagem da Aninha surge meio desfocada.
- Sim, mãe,Eduardo está melhor,  acho que não vou poder falar contigo agora, vou ligar pro Jorge, ver se ele pode vir aqui pra casa pra ficar com as crianças, estou meio sem forças, acho que é pressão. Tchau, mãe, depois te ligo.

A imagem travou, a câmera desligou, D. Maria ligou de novo, chama chama chama e nada. Chama. Chama. Nada. 

E se...
E se Aninha desmaiou? 
D Maria liga pra Gilberto. Nada. O genro nunca atende essa hora. 
E se o Gilberto não atendeu a Aninha?
E se a Aninha estiver com o corona?
E se alguém chamou a ambulância?
E se a ambulância levar Aninha pro hospital?
E se Aninha for entubada?
E se Aninha morrer?
E se nunca mais ...
D Maria se desesperou. E o Gilberto não atende...E o celular da Aninha não atende.
E se... 
Dona Maria vai se vestir e chamar um Uber. Tem que viajar. Precisa se despedir da filha. 
O Uber chega. Não leva idoso sozinho.Devia ter avisado que era idosa. O Uber se oferece pra chamar alguém pra ajudar Dona Maria. 
Dona Maria voltou pra casa, pro apartamento. Liga de novo para Aninha. Nada. Gilberto, nada.
Dona Maria ligou pro síndico. 
- Calma, Dona Maria, a senhora não conhece ninguém mais na cidade? Me passe o número de sua filha e do seu genro. Da empresa que eles trabalham.
Dona Maria desligou o celular pra procurar os números. Onde está a caneta? E o papel? Dona Maria não sabe mandar contato. Precisa ter calma, agora não é hora de ter chilique. 
Celular toca. Dona Maria olha com medo. É o Gilberto.
- Dona Maria, aconteceu alguma coisa? Tem várias ligações suas, eu estava em atendimento...
- Gilberto, a Aninha, Aninha quer falar com você...
- Sim, mas...A senhora está bem?
- Para onde levaram Aninha?
- Dona Maria, Ana está com as crianças em casa...
- Ela ia chamar você, Gilberto.Aninha está doente.
- Não está doente, não. Ela mandou mensagem há pouco, Eduardo estava com alergia de gato.A senhora está bem? O que aconteceu, Dona Maria? Quer que chame alguém?
- Não, Gilberto.Não sabe se chora, se briga, se reclama, melhor nada, vão dizer que está louca. Fala devagar: Eu tive um sonho ruim, só isso.
Alergia de gato...Mas eles não têm gato...
E se ...
E se...

A história ainda teve  mais detalhes chocantes, era pra rir, todo mundo estava achando muito engraçado, a velha estava louca, sim.
Mas eu me coloquei no lugar de Dona Maria...
E se fosse um filho, uma filha...Uma amiga. 
Velho não pode sair.
E se?
...


quarta-feira, 6 de maio de 2020

ROTINA DEPRIMENTE



É muito fácil dizer "Fique em Casa!". Já é um mantra. E ainda tem que agradecer porque a gente tem casa, tem comida, tem saúde, tem remédio e tem um celular bom. E agradecer e reclamar se tem marido, filhos, cachorros, gatos, papagaio, tartaruga...
Minha vizinha tem marido, filha, genro, netos, o apê é um movimento todo dia, todo mundo em casa. Fico com ciúme. Porque eu  tenho só eu em casa. Aliás, apê.Se eu tivesse casa...na praia...na fazenda...Me mudava pra lá. Como não tenho, vou ter que inventar coisas diferentes para sair da rotina que a casa me obriga, aquilo que sempre falei: Tenho uma idosa pra cuidar - que sou eu mesma - arruma cama, limpa banheiro, limpa cozinha, faz comida, suja tudo, lava roupa, arruma armário, blá blá blá. Se for muito exigente, vai-se o dia. E ainda tem que ouvir: 
- Tu és sozinha, não tem nada pra fazer...Coisa boa essa tua vida. 
Exatamente: sozinha, estou com tontura, preciso de um copo d'água; levanto e vou pegar...
Quando vai chegar aqui aquele robô japonês que faz tudo?

 Por isso, a importância de fazer um horário tipo de escola para incluir na rotina:

- ligar pra família
- ligar para amiga
istockphoto
- fazer alongamento
- espiar face
- ver série
- ver novela
- ver notícias
- ler um bom livro
- ouvir uma boa música
- fazer uma comida muito gostosa
- comer a comida gostosa
- beber uma coisa muito boa
- esparramar-se no sofá da sala
- não limpar a  sujeira da cozinha
- pesquisar que sempre tem uma live


 No mínimo, foram 20 horas, e ainda tem que dormir. E amanhã tem tudo de novo. 
Uma rotina deprimente.

sábado, 18 de abril de 2020

IDOSA SAFADINHA


Awebic-Autossabotagem espiritual
Bem quietinha, em casa, ganhando tudo na frente da porta, nunca fui tão paparicada. Só no celular. Não tem mais o que fazer, vou fazer sfiha  que é a popular esfirra e a minha é boa. Todo mundo diz.
Tem tudo em casa. NÃO!!! Falta fermento.Pedir pros filhos trazerem fermento, que abuso. Mas eu quero fazer sfiha agora.
  Não sou doente, nem diabética sou mais. Joelhos doem às vezes, mas isso não é doença.Tenho 71 anos. Estou sem febre, sem tosse, fiz um monte de máscaras, lavei 553 vezes as mãos, gastei 3 litros de álcool gel, bem alimentada - até demais - nem rinite eu tenho, o que é marca registrada de Curitiba. Banho, cabelo com secador, brinco, batom não dá pois suja a máscara, perfume, roupa de passear, não levo bolsa,muito grande,  o cartão vai no bolso. Acho que dá pra ir correndo no super (aqui em Curitiba é Mercado).Sou eu que dirijo, o Gordinho é só meu, tem álcool gel no carro. Desço no elevador apertando o botão com a ponta da chave. Rezo pra encontrar ninguém. E que não tenha muito carro lá.
No estacionamento do super procuro um lugar de não-idoso, pra não chamar atenção. Tem pouca gente nesse horário, Entro disfarçando, de máscara e óculos escuros, caminho toda empertigada, cuidando pra não renguear. Seguro o carrinho depois de lambuzar de álcool gel. Pouca gente, vou aproveitar e pegar cacetinho, manteiga, batatinha e  cocazero . E fermento.
Tinha uns funcionários sem máscara repondo as gôndolas, uns clientes no açougue muito juntos, fui pro caixa com vontade de dar mais umas voltas, mas eu me comportei. Vou fazer uma reclamação. Como pode ter funcionários sem máscaras? E não tinha marcas de distanciamento no açougue.
Paguei as compras, passando álcool nas sacolas. Olhei a recepção. Vou reclamar.
Mas... Uma luz me acendeu, parei por segundo, e se?
 E SE me disserem: - O QUE A SENHORA ESTÁ FAZENDO AQUI? Sabe que IDOSA é do grupo de risco?
Eu posso dizer:- Moço, o Trump tem 73 e faz essa bagunça no mundo, eu só vim pegar fermento.
Mas não disse nada. Meti o rabo entre as pernas e me mandei.
Cheguei em casa, tirei sapato na porta, tomei banho, nem fiz mais nada.
Não contei nada pra ninguém que fui ao super. Esse segredo vai pro inferno.
Me senti uma idosa sem vergonha. Safadinha.
Nunca mais.
Juro que nunca mais.


quinta-feira, 2 de abril de 2020

MOMENTOS FELIZES DEPOIS DOS 70




"A felicidade é mesmo um momento mágico e duradouro como sempre ensinaram? Melhor não contar com isso:Aprende a apreciá-la em doses mínimas e nas alegrias de pequeno porte."


Dia Primeiro de Abril de Dois Mil e Vinte. Como é diferente escrever a data assim, mas foi um dia muito importante nos meus 70 e uns anos. Festejei o aniversário de meus netinhos mais novos, Malu e Martin, 3 aninhos, por vídeo. Já estou acostumada a festejar meus netos de longe, tenho dois que moram do outro lado do mundo, mas desta vez foi estranho. Moro apenas a uma quadra de distância da casa deles. Foi uma angústia saber que eu poderia estar junto. Por quê? Por que não? 
Porque não e pronto - diriam meus pais. Simples, assim.
Existe uma lógica inteligente neste momento: isolamento social pois existe uma pandemia. Isolamento físico, pois sou do grupo de risco. Posso levar ou trazer um vírus ainda não exterminável.
Cada passo é como se estivéssemos pisando num terreno minado. Assim como nos filmes.Ninguém sabe onde está a mina.Em qualquer lugar do Planeta. 

Cantamos parabéns, nossa Pequena Amada Grande Família pelo celular. Separados, mas juntos.Por alguns minutos, só o que queríamos era ver os aniversariantes encantados com as velinhas, os pais festejando, 3 anos que vivemos crescendo juntos.
Mais um momento de felicidade. 
Tem que registrar. Tem que saber aproveitar. É o que mais importa. 


"Na verdade, o que existe é uma felicidade distribuída em contagotas."

Melhor ser minimamente feliz por várias vezes do que viver 
em compasso de espera.



segunda-feira, 23 de março de 2020

SOZINHA, MAS NÃO SOLITÁRIA ou SOLITÁRIA, MAS NÃO SOZINHA?

hypeness

Nem sei há quantos anos escrevi um título desses,
acho que em 2011, foi uma
história da Mirinha lá no Cassino: 
Sozinha, mas não solitária. 


Ficar sozinha é uma coisa; escolher ficar sozinha é uma opção;morar sozinha também é opção ou obrigação; TER que ficar sozinha é diferente.

Isolada, domingo sem almoço com os filhos,sem afofar os netinhos,  uma filha entregar uma sacola de longe, a porta entreaberta, não tocar, não dizer oi e beijar....muito estranho e dolorido. O pão novinho da padaria trazido pelo vizinho solidário, sacolinha pendurada na maçaneta da porta externa. O entregador da farmácia lá na frente, a zeladora tem que ir pegar pra também deixar na minha porta.
De repente, parece que eu sou leprosa, mas não, sou uma idosa no grupo de risco. Se o vírus me pega, vou ocupar um leito que poderia ser pra outra pessoa que precise mais.E espalhar o vírus por aí.

Todos nós, idosos, tem um dia em que pensamos, "puxa, já vivi tanto, se eu morrer já aproveitei bastante". XÔ, pensamento negativo, olha na Itália, os idosos morrendo, as famílias chorando.Italianos que gostam de enterrar seus mortos e gritar, abraçar-se, mama mia, não podem sequer se despedir dos entes queridos. 
Nunca mais a gente vai se ver. 
Lembro quando minha velha avó Marica morreu. Eu só queria ir com ela.Depois, meus velhos pais se foram, o chão desapareceu dos meus pés. Nunca mais os vi. Dói pra sempre.

Isso tudo eu falei ontem, pra uma amiga que queria sair de casa. Que não aguentava mais ficar sozinha. Amiga, tu estás sozinha, mas não  solitária. Daqui a pouco estaremos comendo churrasco, jogando mexemexe,ou bingo, ou bordando, ou no cinema, ou com a família, dando aquelas risadas ou chorando, emburradas, reclamando do preço dos remédios. 
Neste momento, nossa OBRIGAÇÃO, nossa contribuição com o Planeta é FICAR EM CASA.

psicodélica.super.abril
E agradecer. Agradecer por termos uma casa, pela comida,pelos meios de comunicação, pela condição de evitar que o vírus contamine mais pessoas. Simples assim. Há tanta vida esperando lá fora. Daqui a pouco. Agora, há tanta vida aqui dentro. Desculpe, vou atender o celular. Não estou solitária.
Estou sozinha, mas não solitária.



Ou solitária, mas não sozinha. É?
                     ?


quinta-feira, 19 de março de 2020

SAIU IGUALZITO AO PAI


Tem uma música da Califórnia da Canção de Uruguaiana que diz "o guri saiu igualzito ao pai", e isso era uma homenagem ao pai e ao guri, os dois bem gente boa, o pai  "era um gaúcho que nunca conheceu luxo, mas viveu folgado, enfim",  com caráter,  honra e respeito ao próximo. 
Filho de tigre sai pintado, a fruta não cai longe do pé, filho de peixe peixinho é, a cultura popular diz tudo. Fiquei pensando...não devo dizer tudo o que penso, mas preciso pensar no que vou dizer. 
Com as redes sociais, tem gente que ACHA que pode dizer tudo o que pensa, com o objetivo de causar likes e conseguir seguidores e chegar a deputado ou a presidente. 
SÓ QUE tem gente que só pensa idiotice, que se segura no casaco do pai pra conseguir imunidade.Um filho bem igualzito ao pai. 
SÓ QUE estou em isolamento pra não prejudicar quem precisa trabalhar. Pra dar exemplo ao filho, embora eu-mãe, e com muito cuidado com o que escrevo, embora não seja sábia.Faço apenas meu dever de cidadão.E tem gente solta por aí, dizendo o que não deve, na contramão da maioria dos brasileiros  que se esforçam para evitar a disseminação de um vírus letal.   
Vivemos numa democracia, não vivemos numa anarquia, principalmente as pessoas em quem votamos ou não precisam cuidar deste povo, tem uma pandemia aí. 
"CALA A BOCA, Batista", tinha uma personagem do Chico Anísio. Que vontade de dizer CALA A BOCA, pai do filho, CALA A BOCA, filho do pai. Tenta passar por sábio, não diz tudo o que pensa.  É o meu país .Ridicularizado por quem devia respeitar uma situação mundial. Fico com vergonha.

quarta-feira, 18 de março de 2020

EU DEPOIS DO JOJO RABBIT


18 / 03/ 2020 - Curitiba - Paraná. BRASIL

Confinada em minha casa para me esconder do Coronavírus19. Minhas ideias precisam sair um pouco desse círculo de terror onde estou no centro: idosa, depois dos 70, diabética(mais ou menos), hipertensa(menos que mais), gorda(mais que menos), problemas respiratórios(ainda não tive ou não sei se tenho), dores nos olhos, nos joelhos, na coluna, no pescoço, alguém achou que eu estava com o vírus. É idade, como dizem meus médicos.
O que preciso registrar para nossas histórias  DEPOIS DOS 70 é como eu me sinto com a necessidade de FICAR EM CASA. Ficar em casa pra quem mora sozinha é um caos. 
Tenho ciúme de quem tá velho e mora com um monte de gente.Pode até andar de máscara em casa, mas tem gente pra encher o saco e obrigar a se mexer.  Só que tenho um gênio do cão (raivoso). Eu me obrigo a viver comigo, até hoje deu certo. Cuido bem desta idosa gorda, pelo menos não atrapalha a vida dos outros. 
Até agora. 

Com a coisa do Coronavírus modificado (até agora penso que mexeram no DNA do coroninha só pra matar os véios do mundo), todos: filhos e parentes e até quem escreve novelas me dizem FICA EM CASA!Todo mundo está preocupado comigo! 

Então tá, estou como a ELSA, presa no esconderijo da guerra nazista. Quando vi o filme Jojo Rabbit (fui ao cinema antes do vírus) fiquei maravilhada com toda a trama, o Jojo tem um amigo imaginário,o Hittler,seu herói, ele é um menino bem nazista, e a mãe dele é da resistência e esconde a Elsa, menina judia. Quem quiser saber dessa muiiiito  interessante história não tão ficção, que veja o filme. Todos temos um amigo imaginário, e em algum instante ficamos escondidos enquanto há tanta vida e tanta morte lá fora.

Por que eu me identifiquei com a Elsa? Porque eu também estou presa em minha casa, tem um vírus lá fora esperando pra me matar. Ele mata idoso. Só que nenhum neto pode me abraçar nem beijar. Nem o Jojo Rabbit pode me me libertar.
O Jojo e a Elsa se encontravam, às escondidas, mas conseguiam. Eu não posso. Elsa não podia comprar sua comida. Eu também não posso, o super está cheio de gente enlouquecida brigando no tapa por papel higiênico, e cada tapa está  cheio de vírus. Se eu sair de casa estou jurada de morte, tá todo mundo de olho, acho que preferem eu bem vivinha da silva. 

Tem uma coisa que eu posso e Elsa não podia: falar com todos pelo whats, pelo messenger, pelo skype; eu posso.

E eu posso dançar, Elsa não podia, estou livre dentro da minha prisão, tchau pra vocês, eu vou DANÇAR! 

(posso, até, convidar Jojo e Elsa).Quem não viu esse filme, veja. Tem na TV e de graça.Dar um tempo nas notícias lá de fora, ter coragem de ver um bom filme, colocar música, cantar e, quem sabe, dançar. A gente pode.


 E, com certeza, vamos fazer nossa:parte FICAR EM CASA, é a nossa participação nesta GUERRA onde o inimigo está invisível.