Ela foi chamada por uma amiga que estava muito triste. Mirinha era uma pessoa muito, muito alegre, onde entrava era como uma luz ou como uma banda de música ou como um palhaço: ela estava sempre de alto astral - para não dispensar o clichê. Uma pessoa feliz. Por isso que a amiga a chamou. Só que nesse dia Mirinha estava se sentindo muito, muito só. Nem a batucada da escola de samba na TV, nem a gritaria e o bumbo dos desfiles dos blocos de rua conseguiram tirar a tristeza de Mirinha. Estava realmente muito, muito só. Nada vivo em casa, agora. Minto: uma folhagem querendo água, algumas moscas - tinha nojo de moscas, ainda bem que vivem apenas 20 horas ( quem disse isso?). De novo o telefone:"Mirinha, vem pra cá, preciso de ti, estou tão solitária" - a amiga continuava chamando.
Mirinha passou mousse arrepiando o cabelo, um batom dourado da Avon, perfume de maracujá - presente da filha longe - pegou a batinha mais colorida, a calça modernosa, sandálias de tirinhas. Como um autômato ligou o alarme, fechou a porta, abriu o portão, tirou o carro, fechou o portão, foi até a casa da amiga, desviando dos mascarados da rua, dos homens vestidos de mulher - nem reparou nos vizinhos, acenando para ela, ela sempre cumprimentava todo mundo.
Estacionou na calçada da casa da amiga. " Mirinha chegou!" a amiga estava na porta, com mais outras pessoas fantasiadas - carnaval. Mirinha entrou, sacudindo os braços, cantando mamãe eu quero, o pessoal dizendo chegou quem faltava, a amiga estava agora muito feliz, e Mirinha cantando, sorrindo, afinal, nem tudo que reluz é ouro. Não podia decepcionar a amiga, precisava ser a Mirinha de sempre, aquela que está sempre feliz. Estava só, muito só. Sozinha, mas não solitária.
A vida começa aos 60 anos. ATUALIZANDO...a vida começa aos 74. Agora, já estou com 75. A pandemia do Corona Vírus passou. A COVID se transformou em doença, que precisamos tomar vacina todos os anos, o vírus se transformou em coisa igual sarampo. POR ENQUANTO, estou escrevendo, copiando crônicas que escrevi nesses tempos de estranheza numa realidade de idosa. QUANDO eu ficar velha, talvez não tenha vontade de escrever mais.
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