1.-
Dialética
“A
discussão é uma forma polida do instinto batalhador, que jaz no homem, como uma
herança bestial; os querubins não controvertem nada, e, aliás, são a perfeição espiritual
e eternal”.Jacobina,”O Espelho – Esboço
de uma nova teoria da alma humana” ;
in Contos - Machado de Assis.
Custei para
entender as palavras do imortal.
Como viver
sem discutir? Não somos querubins, somos humanos, portanto, não temos a
perfeição espiritual nem eterna.
“Nossa
eternidade é finita”, isso fui eu que escrevi, desculpe, Machado, por misturar
minhas humildes definições na análise das palavras de teu personagem. Devo, porém,
concordar com a ideia de que a discussão é uma herança bestial, e como
se torna difícil resistir a uma boa e acalorada discussão. Como evitar?
A alma se
revela quando vem do mundo exterior, um dardo fatal que mexe com as convicções
de muitos anos de existência. Essa é a maior questão: a alma. Se eu tivesse uma
só alma, tudo ia ser simplificado. Razão e coração, material e espiritual, tudo
junto. E não é assim.
2.-
Retórica
Fiquei
pensando muito neste Machado que redescubro a cada leitura. Diz ele, no mesmo
conto, que temos duas almas, uma que olha de dentro para fora e outra que olha
de fora para dentro. A alma exterior é a do mundo, que transmite a vida, que me
faz responder ao que me prende do lado de fora; a segunda, a alma interior, é a
que me diz quem eu sou.Sou aquilo que eu quero ou aquilo que querem que eu
seja?Clichê, isso.Mas verdadeiro. Essa exigência exterior me obriga a ter que
fazer o que nem sempre quero. Um trabalho,um gesto,uma palavra; uma roupa que
detesto,um horário insano, expressões significativas como engolir sapo,
descascar abacaxi,vestir a camiseta.É a profissão, a moda, as regras da
sociedade, mostrar o que tem. Mesmo que a alma interior chore, reclame, e de
vez em quando, me obrigue a argumentar.Réplica e tréplica.
Ter para
ser, isso não é nada. O TER está ligado à alma exterior. O SER é a alma interior.
Ser ou não ser…É o que dói.
Revelar-se?
Never, nunca, jamais…Ninguém entende o interior.
Já o
exterior está aí, aplaudido por todos,se tiver riqueza, status, fama. Se, não,
dane-se!
Vestir a
pele do cordeiro sendo lobo. Mostrar-se lobo, sendo cordeiro. Exigência
externa.
Preciso ser
rica,magra, jovem. Só.
Aplausos, Bella…
Cala a
boca!
Rica e
magra e jovem. Só. Tudo que o exterior exige.
“E quando
sabemos todas as respostas, vem o diabo e troca todas as perguntas”.
Não sei
mais nada. Eu só sei que nada sei.
Preciso
parar de ler Machado de Assis... e Martha Medeiros… Pela nongentésima vez.
Preciso da
Mirinha.
Toda
loucura não será castigada.
…………………………………………………………………………………………………
“…não
há uma só alma; há duas almas. Cada criatura humana traz duas almas consigo,
uma que olha de dentro para fora, outra que olha de for a para dentro. A alma
exterior pode ser um espírito, um fluido, um homem, muitos homens, um objeto,
uma operação. Há casos, por exemplo, em que um simples botão de camisa é a alma
exterior de uma pessoa; e assim, também a polka, o voltarete, um livro,, uma
máquina, um par de botas, uma cavatina, um tambor, etc. Está claro que o ofício
dessa segunda alma é transmitir a vida, como a primeira; as duas completam o
homem, que é, metafisicamente falando, uma laranja.Quem perde uma das metades
perde naturalmente a metade da existência, e casos há, não raros, em que a
perda da alma exterior, implica a da existência inteira”. Idem Machado de Assis.
(
Será bem asssim? Perder tudo da alma externa implica a existência inteira? Nem
rica, nem magra, nem jovem. E joelhos estragados.TÔ FERRADA! )
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