SOU ALCOÓLATRA
Quando a bebedeira está demais, eu juro que nunca mais vou beber.Estou gastando tudo que ganho em bebida. Fico devendo no banco, no cartão, mas vou levando, fingindo que trabalho durante todo o dia, trabalho muito para sustentar a família.
Ninguém sabe que preciso cada vez mais de dinheiro para poder comprar bebida. Me dá uma raiva dessa gente que se faz de boazinha, mas no fundo espera que eu faça festa e convide o povo. Só eu sei que sou alcoólatra de nascença, meu pai, minha mãe, todo mundo bebia. Eu achava aquilo horrível. Amava meus pais.Nunca vou beber, eu dizia.
Mas o sangue precisa de combustível para poder correr nas veias. O cérebro só pensa se eu todos os dias oxigená-lo com qualquer bebida. Prefiro cerveja, mas como é caro! Então, um dia, ou melhor, uma noite, não achei nem pinga em casa. Bebi álcool.Um pouco só, mas me acalmou. Por isso, acho que sou alcoólatra.
PSICÓLOGO
Fui. Escondido de todo mundo. Procurei na internet, liguei, uma grana. Fui.
Menti. Disse que era para um amigo, sei que o psicólogo não acreditou.
Contei toda a história. Que é de família. Que meu amigo não é alcoólatra, que tem problemas,que é legal, feliz, amigo... quando bebe.
Caso pra psiquiatra, falou.Pedi ao psicólogo que me conseguisse um remédio pro meu amigo. " Não posso, quem receita é psiquiatra. Só."
Voltei pra casa e enchi a cara. Saí pra rua, pois todo mundo estava preocupado comigo.Eu andava muito estranho.
No bar, encontrei meus amigos. Só eles me entendem. Paguei cerveja pra todo mundo, todos ficaram felizes e me abraçavam. Meu cartão foi recusado, excedeu limite.
Os amigos sumiram, desapareceram. Fiquei caído na porta do bar. A porta fechada do bar.
Culpa do psicólogo que não me curou.
EU NÃO SOU ALCOÓLATRA!
Eu só bebo ao cair da noite. Chego em casa seco, doido por um gole. Apenas pra relaxar das dificuldades do dia.
Antes da 20 horas procuro fazer tudo que é preciso: Chefe, esposa, filhos, pais, cachorros.Ansiedade, raiva que vira ódio.
Meus verdadeiros amigos estão no bar. Eles me entendem. Sempre a minha espera. Todos os dias eles estão ali. Papo bom, não aquelas reclamações de trabalho e de casa. Então bebo, e tudo passa.
Eu ainda ficava em casa, mas era aquilo de bebê chorando, mulher reclamando, um saco.Eu tinha que parecer feliz, já vai beber? Então vou pro bar.Encher a cara e ser feliz.
Eu sou dois: um, é aquele certinho, todos me acham um amor, de vez em quando encho o saco e largo as patas, todos se afastam e eu fico feliz, me isolo dentro do celular; o outro, é o cara feliz e falante que todo mundo adora, tiro foto, mando pra todo mundo, pra ver como sou legal. Se eu fosse mulher, vivia sozinha, deixava família, mas eu não sei fazer as coisas de viver igual.Por isso, ter casa e comida precisa. Por isso, preciso de uma bebida. Fico legal, faceiro, amigo, futebol, política e carnaval, baixa mais uma, tô pagando.
Sou um cara legal. Não sou alcoólatra.(Vou me confessar: amanhã vou parar de beber).
Série Confissões